POMBERO: PYHARE JARA

Sousa, N.M.[1]

A mitologia é uma narrativa que confere sentido ao caos transformando-o em cosmo, reafirma ao um grupo quem ele é e conserva a memória histórica. Um destes mitos populares de origem guarani e disseminado pela América Latina é a história do Pombero.

Este personagem, indutorde de comportamento moral, está conectado com vários outros nas narrativas indígenas coletadas por Leon Cadogan, Kurt Nimuendaju e Pierre Clastres. Em primeiro lugar seu espaço-temporal é a noite. É o dono da escuridão, Pyharê Jára. É o antagonista do criador, Nhande Ramõi Jusu Papa ou Nhanderuvuçu, que trazia a luz em seu peito que emanava de seu coração, chamado nos cantos religiosos Guarani-Mby’a de Nhanderu Py’a Guasu, o pai de coração grande. O criador fez surgir seu próprio corpo em meio às trevas originárias. A escuridão do mal, produzida pela Urukue’a, representada por Mbopi Karu, reinava absoluta antes da primeira terra ser erguida.

Antes da criação da primeira terra, Yvy Tenonde, havia as trevas originárias, onde reinava Urukue’a, a Coruja. Em meios às trevas originárias do caos, o criador desdobrou, nhanduá, com sabedoria, mba’e kua’á, um esteio, yvyrá joasá, a partir do qual constituiu e estendeu a terra, ergueu o firmamento, separou os ventos e trouxe a água a partir do Jasuka, o princípio vital. Seu trabalho foi concluído antes da primeira primavera, o tempo novo da nova terra.

A coruja, chamada também de Guaruje pelos kaiowá, habita um buraco no céu, semelhante a um buraco negro, segundo o nhanderu kaiowá Nelson. As demais corujas terrestres, imagens (taangá) da originária, são portadoras de notícias de mau agouro, infortúnios ou Mba’ê Meguá.

O Pombero, segundo os relatos, circula fora das cidades e nos boques, é musculoso, peludo, sedutor e provocador de alvoroço entre os animais durante a noite. Tem vários nomes: Pyrague (Pés Peludos), Karai Pyhare (Senhor da Noite), Kuarahy Jára (Dono do Sol) e Chopombê (Dom Pombero). Aprecia tabaco, mel e aguardente e pode fazer o bem ou o mal, dependendo do comportamento humano. Não se pode gritar o seu nome, falar mal dele, nem pela internet, não se deve chamá-lo à noite e nem assoviar, pois isso atrai sua ira. Costuma rondar mulheres grávidas, pois acredita ser o pai e pode raptar bebês pequenos que ainda não foram batizados.

Seu trabalho é defender as matas e animais selvagens, protegendo-os da caça sem necessidade. O caçador que não segue os rituais, mata muitos animais, corta árvores sem necessidade e pesca peixes além da conta é atraído por ele, transformado em animal, e se perde eternamente na floresta. Por isso, o Pombero também é associado a outros personagens como o Ka’aguy Jára (dono da mata), Ka’aguy Póra’i (fantasma da mata) ou Jasy Jaterê (fragmento da lua, filho de Tau e Keraná).

A palavra pombero faz referência à espia nas expedições militares e a origem de seu nome pode vir da lingua guarani, po, mão, mberu, mosca, devido à sua ação quase imperceptível. É considerado também o protetor das aves silvestres, daí o uso do nome Guaruje, de Guyrá Jára (dono dos pássaros) e provável etimologia tupi da palavra Guarujá.

 

REFERÊNCIAS E FONTES:

CADOGAN, Leon. Ayvu Rapyta. São Paulo: USP, 1959.

CLASTRES, Pierre. A Fala Sagrada. São Paulo: Papirus, 1990.

NIMUENDAJU, Kurt. As Lendas da Criação e Destruição do Mundo como Fundamento da Religião dos Apapocúva Guarani. São Paulo: Hucitec-USP, 1987.

SOUSA GUARANI, Teodora et all. Ka’aguy Póra’i. Dourados: EdUFGD, 2018.

 

IMAGENS:

GONÇALVES, Claudia. Ka’aguy Póra’i. Dourados: UFGD, 2018.

POMBERO. O Dono da Noite.

[1] Doutor em educação pela UFSCar. E-mail: neimar.machado.sousa@gmail.com

Tags: jara, pombero, pyhara

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