A narrativa do Mito dos Gêmeos possui muitas versões em muitas línguas indígenas. Este fragmento reproduz a disputa por um lugar junto ao fogo entre o sol, a lua e o cervo e o encontro com o Jaó e o Jacu.
Conforme o narrado pelo ancião kaiowá sr. Cirilo Rossate (83), coletado no ano de 1970 em Amambai (MS), quando os meninos iam dormir aquecidos pelo fogo, chegou o veado pardo, guasu pytã, que também tinha o seu fogo para se aquecer enquanto dormia. Pa’i Kuará disse: - vou posar na sua casa, meu amigo. Podem dormir por aí, disse o veado, não querendo que suas visitas chegassem perto do fogo. Podem dormir por ali, pois aqui vou por uma perna e aí a outra perna. Por ali colocarei meus braços e naquele lugar a minha cabeça e naquele lugar o meu traseiro.
O veado pardo, guasu, dizia isso porque não queria que ninguém dormisse perto de seu fogo. Foi assim que o guasu disse ao Pa’i Kuará que dormiu num lugar qualquer. Quando chegou meia noite, a Lua Jasy disse ao irmão: - estou com muito frio, faça fogo para mim, ke’y. O sol fez uma fogueira para o irmão, empurrando as brasas da fogueira do cervo e assoprou com muita força as brasas, fazendo barulho: xupy, xupy. Este barulho assustou o veado que saiu correndo.
Quando o veado saía correndo, o Sol disse para ele: seja veado pardo, viva nas matas e sirva de alimento para as onças. Quando terminou de falar isso, o cervo já foi capturado por uma onça.
Na manhã seguinte, os gêmeos continuaram andando até chegarem perto de onde vivia o Hohõo, hoje conhecido como Jaó. Este pássaro andava cantando e a lua ficou assustada. Jasy rezou assim: - não me acontecerá nenhum mal. Esta era a reza da lua.
Depois de rezar, chegaram à casa do Jaó, que estava à beira do seu fogo. – vou dormi na sua casa, meu amigo. A casa do Jaó era boa. O pássaro respondeu: - podem dormir. Pa’i Kuará fez a cama junto de seu irmão e quando chegou perto de meia noite, a lua estava com frio novamente. – Estou com frio, ke’y, faz fogo para mim. Pa’i Kuará levantou, juntou e quebrou umas varinhas secas, acendeu o fogo e assoprou com força. O Jaó assustado voou embora.
Seja como Jaó, viva nas matas e se alimente das sementes secas, disse o sol. Quando disse isso, o Sol colocou comida para alimentar o Hohoõ. Depois, continuaram caminhando e quando iam longe ouviram um barulho: tá, tá, tá.
Era o Suruku’a, um pássaro antigo e antepassado de muitos outros. Este pássaro estava fazendo um cabo de madeira para seu machado quando chegou Pa’i Kuará. – O que está fazendo, meu amigo? Mba’e iko erehexa Paî? Um cabo para meu machado, respondeu. Pa’i Kuará bateu na madeira que o pássaro estava lavrando e disse: - seja como Suruku’a até o fim da terra. Ele saiu voando dali.
No dia seguinte, chegou também o Jacu. Ele andava cantando guahu e kotyhu. – O que está fazendo, meu amigo? - Ando cantando o guahu da bebida da minha fruta, respondeu o Jacu. – Por que estão mandando em tudo, perguntou o Jacu, querendo falar daqueles que comeram a mãe dos gêmeos. Pa’i Kuará ficou quieto, lembrando que as onças ainda esperavam na margem do rio para chegar ao campo das guaviras.
REFERÊNCIAS E FONTES:
AQUINO, João. Mito dos Gêmeos. Tradução de João Aniceto. Compilado por Wilson Galhego Garcia. Araçatuba: Faculdade de Odontologia, 1975.
Garcia, Wilson Galhego; Ribeiro, Aniceto. Cinco versões dos mitos dos gêmeos entre os Kaiová, Terra Indígena, n. 82: 11-201. out 2000.
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