Mohãy é um dos termos para feitiço na língua guarani, uma forma de guerra espiritual entre parentelas. O feitiço atinge pessoas e coisas. Das primeiras espanta o espírito, matando-as, e das segundas, as transforma em mercadorias.

As mercadorias enfeitiçadas nos fazem acreditar que pareçam ser o que não são, pois são assombradas por relações sociais, como se uma sombra pairasse sobre elas. O feitiço é operado por palavras, objetos e à distância. Já o fetiche da mercadoria é a sua capacidade de ocultarem atrás de si as relações sociais de exploração.

Muitas comunidades indígenas ainda vivem sob o ataque de feiticeiros fantasmagóricos que provocam a sua morte para pruduzirem mercadorias como soja, cana e proteína animal. Aos desaparecidos, enfeitiçados do fetiche da mercadoria, não resta nem uma cova rasa no latifúndio.

Assim como a mercadoria enfeitiçada foi produzida mediante a alienação do trabalhador, o feiticeiro domina técnicas que espantam o pássaro das pessoas. O distanciamento entre a mercadoria e o trabalhador e o ocultamento das relações sociais envolvidas na sua produção são semelhantes aos amuletos do feiticeiro que parecem ter vida própria. Assim como os amuletos, as coisas, metamorfoseadas em mercadorias (mba’e pochy), dissimulam quem são e do que são capazes.

A semelhança entre o mohãy e a mercadoria é a abreviação da vida. Nhanderu nos proteja da alienação.

Os objetos malignos introduzidos no corpo de outra pessoa e que provocarão a sua morte somente poderão ser removidos pelo mohãy járy, dai a necessidade de se identificar o autor do feitiço para afastar seu desfecho. Feitiçaria e enfermidade são faces da mesma realidade e afetam toda a coletividade. As doenças podem ser produzidas por palavras nocivas, rezas proibidas e ervas capazes de fazer mal a inimigos pessoais, sendo usadas em caso de vingança pelos seus conhecedores, xaças de menr hierarquia. Somente os mais experientes, pa’i guasu, estão habilitados para identificar e punir os autores, agentes do mba’e pochy, após identificados coletivamente.

Os curandeiros protegem o grupo dos males que os feiticeiros introduzem em suas vísceras. Só existe uma cura possível para a dor coração da mãe da vítima do feitiço contra os que deixaram de amar seu próximo, destituiram-se de si e viraram onças.

 

REFERÊNCIAS E FONTES:

BRAND, Antônio (1997). O Impacto da Perda da Terra sobre a Tradição Kaiowá/Guarani: os difíceis caminhos da palavra. Tese. Pontifícia Universidade Católica (PUC/RS).

MARX, Karl. O Capital: crítica da economia política. 6 vols. Rio de Janeiro: Bertrand, 1994.

 

NOTAS:

  1. Pesquisa, organização e adaptação: Neimar Machado de Sousa, doutor em história da educação (UFSCar) e pesquisador (FAIND/UFGD). Karai Nhanderovaigua. E-mail: neimar.machado.sousa@gmail.com
  2. O artigo tem objetivo educacional e formato adaptado às mídias sociais.
  3. A grafia adotada para as palavras indígenas segue as fontes consultadas.
  4. METADADOS: mohãy, mba’e pochy, mohãy járy, pa’i guasu,
  5. IMAGEM: HILTON, Leninha. Gwyra. Dourados, 2019.

 

Tags: guasu, járy, mba’e, mohãy, pa’i, pochy

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