Uma epidemia social de violência contra as mulheres indígenas se alastra nos Estados Unidos, Alasca e em outras regiões do mundo. Há muitas indígenas desaparecidas ou mortas e as comunidades exigem providências urgentes do congresso.

É preciso deixar claro que a omissão em coibir a violência sofrida por uma só pessoa, seja ela indígena, mulher ou qualquer outra, atinge toda a humanidade. O Brasil, não muito diferente dos EUA, é o país das Américas que mais mata defensores de direitos humanos, alertou a Anistia Internacional.

Um estudo recente do Instituto de Saúde Índio Urbano, Urban Indian Health Institute, sobre mais de 5.712 casos de mulheres desaparecidas no ano de 2016 traz dados alarmantes sobre desaparecimentos e assassinatos de mulheres indígenas em 71 cidades norte-americanas. Na cidade de Tucson (Arizona) foram 31 casos, em Albuquerque (Novo México) foram 37 e em Seattle (Washington) 45 casos. Ao todo, nos EUA, foram 506 casos, sendo que mais de 10% de todos eles ocorreram no estado do Arizona (56). O relatório trouxe a média de idade dessas mulheres: 29 anos de idade. O estado mais violento foi o Novo México. Destes 506 casos, 153 não chegaram sequer ao conhecimento da justiça, indicando a invisibilidade das mulheres indígenas.

Em uma das reservas indígenas dos EUA, a Navajo, há menos de 200 policiais para patrulhar uma área de 6,7 milhões de hectares. A situação alarmante dos perigos enfrentados pelas mulheres indígenas é desconhecida pela grande maioria do povo americano e tem chamado a atenção da representante indígenas nas Nações Unidas (ONU).

De acordo com o Instituto Nacional de Justiça, mais da metade foi agredida sexualmente e um terço foi estuprada, numa proporção muito acima da média das mulheres brancas. Para meninas e moças de 15 a 24 anos, o homicídio é a terceira maior causa de morte. E milhares de mulheres e meninas indígenas americanas e do Alasca simplesmente desaparecem. A crise é ignorada há muito tempo.

No Brasil, familiares e vítimas do feminicídio marcaram presença nos atos públicos exigindo justiça neste último oito de março. Bia Kokama foi uma destas mulheres indígenas que marchou em Manaus, onde afirmou: “Nós lutamos pelo direito à moradia, saúde, escola e também pelos direitos das mulheres indígenas, muitas de nós ainda sofremos com a violência, abuso e nós queremos que isso não aconteça mais com nós, mulheres”.

Nos EUA, o governo federal financia serviços policiais, investigação criminal, instalações de detenção, tribunais tribais e muito mais. Mas a ajuda em sido insuficiente para coibir os crimes contra as mulheres. Um grande problema subjacente é que as agências indigenistas responsáveis pela aplicação das leis tribais não têm recursos humanos para atuar, muito menos para policiar vastos territórios.

A reserva Navajo, por exemplo, com cerca de 350.000 habitantes em 6,7 milhões de hectares no Arizona, Novo México e Utah, tem menos de 200 policiais e 30 investigadores. Esta relação entre a polícia e a população é significativamente menor do que a média nacional. No entanto, a taxa de homicídio na reserva é muitas vezes maior do que a média.

Outro problema exclusivo para a aplicação da lei tribal é a confusão jurisdicional. Um crime perto da reserva terra pode passar pela mesa de oficiais indígenas, polícia local, o FBI, o escritório de assuntos indígenas e a polícia estadual, levando a atrasos e equívocos nas investigações.

Em um caso de 2016, quando uma menina foi sequestrada no Novo México, a má coordenação entre as autoridades policiais levou a um atraso de oito horas na emissão do alerta.

Fora das reservas, também, as mulheres indígenas enfrentam muitos perigos. Muitas mulheres que vivem nas cidades estão desaparecidas ou mortas e as delegacias de polícia costumam fazer um trabalho ruim e não resolvem os casos. Um estudo recente do Instituto Indígena Urbano da Saúde identificou 153 casos de mulheres desaparecidas cujos casos não eram conhecidos das autoridades policiais.

As bases de dados policiais sequer diferenciam os indígenas de não-indígenas e nem tem dados sobre a violência contra as mulheres indígenas. As senadoras Lisa Murkowski (Partido Republicano/Alaska) e Catherine Cortez (Partido Democrata/Nevada) acabaram de reapresentar um projeto de lei para focar a atenção e recursos sobre o tema. O projeto chama-se "Savanna's Act" em memória à Savanna LaFontaine-Greywind, uma jovem de 22 anos de idade, assassinada em Dakota do Norte em 2017. O projeto de lei propõe, entre outras coisas, consultas anuais entre os advogados dos EUA e tribos indianas sobre a violência sexual, formação e assistência técnica para a polícia tribal, e novas regras para relatar e compartilhar dados do crime e responder a crimes violentos.

Esses seriam apenas os primeiros passos para melhorar as relações entre as autoridades tribais e a aplicação da lei estadual e federal, reunindo dados cruciais do crime e financiando esforços do governo tribal para proteger as mulheres e as meninas indígenas.

 

REFERÊNCIAS E FONTES:

Anistia Internacional. Relatório Anual. Brasil, 2017.

Covey, Sarah. Missing or murdered indigenous women numbers high in Arizona. Tucson: Kgun9, 2019.

Lucchesi, Annita; Echo-Hawk, Abigail. Missing and Murdered Indigenous Women and Girls. Seattle (WA): UIHI, 2017.

YAMADA, Erika. Direitos Humanos e Povos Indígenas no Brasil. DHESCA Brasil: Curitiba, 2017.

 

IMAGENS:

Fallon, P. T. Navajo Reserve. EUA: Bloomberg, 2019.

BESSA, Indiara. Bia Kokama. Manaus: G1, 2019.

Tags: indígenas, mulheres

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