A anta é um ancestral mítico importante nas narrativas indígenas. Este animal apresentava-se como um jovem bonito, sendo conhecido como Tapir, Tapi’i, Mborevi e So’o Ruvicha. O Mborevi é o protetor dos animais comestíveis.

O criador, Nhande Ramõi Jusu Papa, deixou para a humanidade duas árvores Yvyrá Pepe, o alecrim, e Angu’a-y, bálsamo. O Angu’a-y tem frutas pretinhas que são comida do cateto, o kure’i. O criador deixou muitas frutas doces para alimentar seus filhos e também o jarakati’a. Para matar a sede, ele deixou água em todos os lugares e chamou a planta que abençoa estas fontes de Ygary, cedro.

Kaja’a foi criada desde o princípio para cuidar das águas. Ela era uma das filhas de Nhane Ramõi Tani. Na Lagoa, o Mborevi era seu marido. Isto aconteceu porque ela não seguiu as prescrições alimentares e de resguardo quando passou pela menarca. A filha de Pa’i Tani ia sempre na roça buscar batata doce. Quando sua filha chegava à beira d’água, ela fazia barulho e um homem se aproximava dela. Naquele dia começou o encantamento, ojepota, dos animais nas moças que não se resguardavam.

Quando a moça voltou para casa, um irmão disse para o outro:

- Um mborevi fez ojepota para sua irmã.

Era a irmã do meio, Haxã mirim, que estava sob encantamento, contou Pa’i Kwará para a mãe da jovem.

- Eu não posso acreditar, respondeu a mãe da moça. Neste momento, a jovem tinha ido na roça e voltou rápido. Lá, um homem sempre aparecia para ela e levava batata assada para ela comer.

Mais tarde a Lua fez barulho na água e o Mborevi já veio, pensando que era a namorada. Quando percebeu a aproximação da Anta, escondei-se no barranco e ficou esperando para atirar sua flecha. Jasy matou o Mborevi, levou a sua carne e entristeceu muito sua irmã. Ela ficou tão triste que até pensou em tirar a própria vida. Isto aconteceu quando se está sob ojepota, encatamento.

Os pedações da Anta foram levados para casa de Haxã e pendurados dentro de seu quarto. Enquanto secavam, pingava um líquido na rede. Depois disso ela foi tomar banho e levou batatas assadas. Um de seus irmãos ficou desconfiado que a irmã estava encantada pela Anta morta. O nome da lua quando caçou a anta era Kwãi Mirim Poty.

A moça perguntou: - Kwãi Mirim, você não foi tomar banho? Ele respondeu que não e ela já sabia quem era a Anta que pingava na sua rede. A mãe da moça permitiu que ela fosse tomar banho, mas orientou que a filha voltasse logo para provar o alimento, kagwi, que estava fazendo de milho e batata.

A jovem foi até o rio, onde o irmão havia caçado a Anta, mas não havia mais ninguém para encontrá-la. Ali ela ficou jogando água para cima e não tinha mais vontade de voltar para casa. Ela ficou tão triste, pois estava se transformando na futura sereia, Kaja’a. Jogava água para cima e dizia: - xe ae taiko kaja’a ramo kuri. Deixe eu ser só uma sereia.

A irmã mais nova, Haxã Mirim, disse à mãe:

- Mãe, Haxã não voltou mais. A mãe disse que o Kagwi estava quase pronto e precisava que Haxã a ajudasse, por isso enviou a irmã mais nova para chamá-la. A irmã voltou e disse que Haxã não queria mais voltar e que já estava quase toda coberta pelas águas. A mãe explicou que era assim que a filha viveria de agora em diante, mas seu irmão não aceitou e foi buscá-la também, mas quando a viu, ela já vivia dentro da lagoa como Kaja’a e até hoje protege todas as águas.

A água para ser purificada desse encatamento tem de ser abençoada com cedro e isy. Se Kaja’a abandona, a lagoa seca em pouco tempo, por isso ao chegar perto das águas é preciso fazer jehovasa, benzimento. A lagoa onde isso aconteceu fica em Cerro Guasu, no Paraguai e se chama Laguna Pytã.

 

REFERÊNCIAS E FONTES:

TERENA DE DOURADOS, Professores. Êxetina Uné. Aldeia Jaguapiru, Dourados/MS: Ação Saberes Indígenas na Escola, MEC/UFGD, 2018.

RIBEIRO, Aniceto, GALHEGO, Wilson. Kaja’a. Assis: UNESP/Revista Terra Indígena, 2001.

 

NOTAS:

  1. Pesquisa e organização: Neimar Machado de Sousa, doutor em história da educação pela UFSCar e pesquisador na FAIND/UFGD. Karai Nhanderovaigua. E-mail: neimar.machado.sousa@gmail.com
  2. O artigo tem finalidade educacional e formato adaptado às mídias sociais.
  3. A grafia adotada para as palavras indígenas segue a forma das fontes consultadas.
  4. Metadados: paca, mborevi, So’o Ruvicha, kaja’a, kure’i, haxã, ojepota, Ygary, Cerro Guasu, jehovasa. IMAGEM: TERENA DE DOURADOS, Professores. Êxetina Uné. Aldeia Jaguapiru, Dourados/MS: Ação Saberes Indígenas na Escola, MEC/UFGD, 2018.

 

Tags: Cerro, Guasu, Ruvicha, So’o, Ygary, haxã, jehovasa, kaja’a, kure’i, mborevi, Mais...ojepota, paca

Exibições: 62

Responder esta

© 2025   Criado por neimar machado de sousa.   Ativado por

Relatar um incidente  |  Termos de serviço