Enquanto o Brasil possuir 654 das 1.113 terras indígenas sem nenhum ato administrativo para concluir sua demarcação e liminares que permitem a permanência de tantas comunidades continuarem sendo derrubadas, a terra continuará sequestrada.

O argumento de que os povos indígenas precisam de internet e dentista ao invés de terra é falacioso, pois os índios já têm internet, wi-fi, laboratórios de informática e dentista.

O estado brasileiro tem demonstrado apetite para falar sobre os índios e anorexia para ouvi-los. Tampouco os índios precisam aprender a empreender, pois já o fazem. Produzem temperos para alta gastronomia, criam uma em cada dez cabeças de gado em Roraima, possuem fábrica de polpa no Acre, exportam Urucum para multinacional de cosméticos e acabaram de inaugurar a primeira vinícola indígena no Chile. Ainda assim, profetas e gurus da elite continuam a pregar o estereótipo do índio preguiçoso.

Os índios recebem turistas na Amazônia encaminhados por diversas agências. Lá, podem fisgar peixes legalmente sem multas, além de ajudar os índios a manter a floresta em pé, pois são os cuidadores e não proprietários das terras indígenas.

As propostas apresentadas como inovadoras para a economia indígena como o arrendamento já foram testadas no passado e com o tempo os fazendeiros alegaram direitos adquiridos e tomaram para si as terras. Ocorreu no sul da Bahia, na Raposa Serra do Sol e em Mato Grosso do Sul. A mineração em áreas indígenas também não é novidade, prevista em lei, precisa ser autorizada pelo Congresso e exige aval das comunidades. Lembremos que a Constituição de 1988 foi concebida nos extertores do regime militar, com autoria do coronel Jarbas Passarinho e indigenistas nacionais. As terras são da União e os índios têm usufruto, ajudando a manter a floresta. As fotos da aeronáutica provam que o patrimônio da União só é preservado nas áreas indígenas. Além de seus limites é grilada, desmatada, queimada e envenenada.

No dia 18 de abril de 2019, o Conselho Indígena de Roraima (CIR) divulgou uma carta em que repudia o discurso feito do presidente e reafirma que “a terra Raposa Serra do Sol é uma terra livre. Sua riqueza está preservada por causa dos povos indígenas que respeitam a natureza”. O CIR é uma organização que representa mais de 49 mil indígenas de 241 comunidades e oito povos de Roraima.

Nesta mesma carta, o CIR afirma que respeitam os indígenas de Roraima que se reuniram com o presidente no dia 17, mas que eles não representam o pensamento das comunidades indígenas do estado de Roraima expresso no documento Final da 48ª Assembléia Geral realizada dos dias 11 a 14 de março de 2019. Segundo o documento, sua posição é contrária à mineração, às hidrelétricas, ao agronegócio e ao arrendamento.

Até o rei da Noruega já se hospedou numa aldeia para aprender sobre os índios, mas o Estado brasileiro continua soberbo e se recusa a reconhecê-las. Há índios que querem viver isolados e outros que optam por estudar na Unicamp e na UFSCar. São 56 mil os índios que estão cursando universidades públicas, privadas e muitos estão nas forças armadas. Nestas instituições ninguém acha que vêm de zoológico, lembrou Márcio Santilli, do Instituto sócio-ambiental (ISA).

Entre os muitos índios que foram à universidade, não abandonaram suas comunidades e chegaram até o doutorado, temos o Dr. Luis Eloy Terena. É ele quem lembra os seus parentes indígenas de seus direitos fundamentais para que possam participar do Acampamento Terra Livre 2019, em Brasília.

O advogado e antropólogo lembra que o ATL não é um encontrão pago pelo contribuinte, mas um momento de luta pacífica e autônoma para dar visibilidade aos direitos, apesar do presidente da República declarar-se inimigo dos indígenas que não pensam como ele e discordam de suas declarações.

São direitos dos povos indígenas e cidadãos brasileiros a liberdade de expressão, a liberdade de reunião e associação pacífica para defender os próprios direitos conforme o artigo 5º, inciso IV e XVI, da Constituição Federal.

O advogado indígena adverte a prática comum dos Estados nacionais de infiltrar pessoas nos movimentos populares para provocar tumulto e violência, recomendando que os participantes procurem conhecer os membros das demais delegações e gravem todas as atividades. Estes cuidados são necessários, pois as forças de segurança não costumam ter preparo suficiente no uso de armas de baixa letalidade (spray de pimenta, cassetete, bala de borracha, bomba de gás lacrimogêneo e bomba de efeito moral). O mau uso destas armas pode causar sérios ferimentos, mutilações e levar à morte.

Ninguém pode ser detido sem saber o motivo, nem mesmo para averiguação, e se alguém o for tem direito a uma ligação, acompanhamento de um advogado para sua defesa e presunção de inocência, garantias ainda previstas na Constituição.

 

REFERÊNCIAS E FONTES:

CIR. Carta Aberta. Roraima: Cimi Norte, 18/042019.

SERVA, Leão. Índios, Bolsonaro e seu pecado. São Paulo: FSP, 28.dez.2018.

TERENA, Luis Eloy. Orientações. Brasília: APIB, 2019.

 

NOTAS:

  1. Pesquisa e organização: Neimar Machado de Sousa, doutor em história da educação pela UFSCar e pesquisador na FAIND/UFGD. Karaí Nhanderovaigua. E-mail: neimar.machado.sousa@gmail.com
  2. O artigo tem finalidade educacional e formato adaptado às mídias sociais.
  3. Metadados: CIR, ATL, Direitos Indígenas. Imagens: ROSHA, José/Cimi Norte I. 48ª Assembleia do Conselho Indígena de Roraima. Roraima: Cimi Norte I, 2019.

Tags: ATL, CIR, Direitos, Indígenas

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